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Três transplantes e um sonho: Conheça a história da Paula

Todos os dias temos contato com nossas famílias, um abraço, um café da manhã compartilhado ou até mesmo um telefonema. Mas para quem vive a realidade dos transplantes, esses momentos ganham um novo significado.

Para a Paula, desfrutar desses momentos só foi possível com uma jornada que exigiu muita resiliência.

Hoje, com 33 anos de idade, e dois filhos, ela já passou por três transplantes de rim. Cada procedimento contou com particularidades e desafios que mostram a complexidade do transplante de órgãos.

A Descoberta

Foi em 2015 que a vida de Paula começou a mudar. A princípio, dores de cabeça frequentes pareciam consequência da rotina corrida e do estresse do dia a dia. Mas com o tempo, vieram os episódios de visão turva e mal-estar constante. Foi aí que ela decidiu procurar ajuda médica.

Como de rotina, vários exames foram solicitados para verificar dentre eles a dosagem de creatinina, que é fundamental para verificar a função renal.

O teste apontou resultados alterados, o que levou o encaminhamento ao Nefrologista, que é um médico especialista no tratamento e diagnóstico de doenças do sistema urinário, especialmente dos rins. Foi então que o diagnóstico veio.

“Eu descobri que estava com 4% da função dos dois rins, e com isso já tive que ir diretamente pra diálise”, explica Paula.

A partir daquele momento, a rotina passou a girar em torno do tratamento. Paula entrou para a estatística das mais de 43 mil pessoas que aguardam por um transplante de órgão no Brasil.

Com as funções renais comprometidas, e já fila de espera por um transplante ela passou a fazer diálise peritoneal. O tratamento tinha como foco filtrar o sangue e eliminar as toxinas acumuladas no organismo, função essa que os rins.

Com isso, a rotina de Paula, e de sua família, teve que mudar completamente.

“A gente teve que mudar muita coisa em casa, por que a diálise peritonial exige muito cuidado em relação a questão de higiene e de limpeza”, salienta Paula.

O processo envolveu o uso de um cateter que fica conectado no peritônio e que precisava ser manuseado em casa. Por conta disso, todo cuidado era necessário.

Desde o processo de limpeza da residência, até evitar a entrada de ar no cateter na hora do manuseio.

Esse foi o tratamento que Paula teve que manter durante meses, até que o primeiro doador fosse encontrado.  

O Primeiro Transplante

Descobrir a necessidade de um transplante é apenas o início. Após o diagnóstico, a família de Paula iniciou a busca por um doador compatível, começando pelos exames em parentes próximos.

Mas esse é um processo que exige muito cuidado. Afinal, é necessário verificar desde o tipo sanguíneo, até a tipagem HLA (Antígenos Leucocitários Humanos).

Essa última é crucial para quem passa por um transplante. Esses antígenos participam ativamente da identificação e da resposta imunológica do corpo à substâncias consideradas estranhas pelo organismo.

Para se ter uma ideia da complexidade da compatibilidade, até o momento, foram identificados 36 mil alelos HLA. Os exames visam justamente verificar a taxa de compatibilidade entre doador e receptor para que os índices de rejeição sejam os menores possíveis.

O processo de testagem da Paula e de seus familiares durou cerca de um ano, período o qual ela manteve o tratamento com a diálise peritoneal. E para a alegria de todos, o irmão dela, Ricardo, foi identificado como compatível.

Assim que a compatibilidade foi confirmada, as próximas etapas foram iniciadas e o transplante realizado.

Paula e sua família puderam respirar aliviados, sabendo que agora ela tinha um novo rim saudável e que poderia retomar as atividades normalmente.

Mas esse foi apenas o primeiro marco dessa jornada de resiliência.

Voltando ao ponto de partida, o segundo transplante

A maioria das pessoas não sabe, mas o transplante não termina quando o receptor recebe o novo órgão. Na verdade, ele continua após o procedimento cirúrgico, com o acompanhamento médico para verificar se não haverá rejeição.

Durante três anos, Paula viveu com o seu primeiro rim, doado pelo irmão. E foi no final desses três anos que ela recebeu uma notícia que ao mesmo tempo despertou muita felicidade, mas que também acendeu o alerta de que ela teria que voltar ao ponto de partida na fila de transplantes no Brasil.

Em 2018, ela descobriu que estava grávida do seu filho, o Heitor. Já sendo mãe de uma menina, a Isabelle, a notícia do segundo filho trouxe muita alegria para toda a família. Agora a família iria aumentar ainda mais.

Mas a gravidez, muito bem recebida, também alertou sobre o risco da rejeição do rim que ela já estava há três anos. Isso porque, durante esse período, o órgão acaba recebendo uma carga adicional.

Afinal de contas, os rins precisam trabalhar em dobro no processo de filtragem do sangue. O volume de sangue aumenta para garantir o bem-estar da mamãe e do bebê, e com isso o trabalho dos órgãos.

Durante toda a gravidez, houve um cuidado meticuloso em relação ao controle da rejeição. Mas após o parto, por conta de todo o processo de recuperação que acabou entrando em conflito com as medicações necessárias, houve a rejeição.

Com isso Paula teve que voltar para tratamentos alternativos, e dessa vez ela foi diretamente para a hemodiálise.

A hemodiálise

O objetivo do processo é o mesmo: fazer a filtragem do sangue. Mas, ao contrário da diálise peritonial onde essa “limpeza” ocorre dentro do corpo, na hemodiálise ela é feita fora dele, em uma máquina e depois devolvido ao organismo.

Esse período durou mais um ano da vida de Paula. Isso porque é necessário manter um período mínimo para que corpo possa criar estabilidade suficiente para passar por um novo procedimento cirúrgico de alta complexidade como é um transplante renal.

Foi depois de 12 meses, em 2020, que a possibilidade de um novo transplante veio, dessa vez de um doador falecido.

A doação foi realizada com sucesso, mas pouco após o procedimento surgir um vírus que trouxe, mais uma vez, a luta contra a rejeição para o dia a dia de Paula.

Muitas pessoas não sabem, mas o processo de adaptação do receptor ao novo órgão envolve o tratamento com imunossupressores.

Isso ocorre porque, apesar do transplante ocorrer após a testagens de mostrarem a compatibilidade, o curso natural do corpo é tentar rejeitar os agentes estranhos no organismo.

Os imunossupressores têm o papel de evitar que o sistema imunológico acabe “destruindo” o órgão recebido. No entanto, isso também acaba afetando a capacidade do sistema imunológico de combater as infecções.

Com a descoberta do agente viral, a equipe médica passou a lutar não só para evitar a rejeição, mas evitar que o vírus prejudicasse o corpo de Paula.

Foram dois anos de uma batalha constante para aumentar e reduzir a capacidade imunológica, mas infelizmente houve a rejeição do segundo rim recebido.

Uma nova chance com o terceiro transplante

Paula retornou mais uma vez para a hemodiálise, onde se manteve por mais dois anos.

Durante esse período, além da recuperação do organismo dela, a equipe médica também estava focada em achar um novo doador compatível, e que também oferecesse maiores chances de evitar uma terceira rejeição.

A contagem alta de anticorpos foi um desafio. Tanto que Paula “concorreu” a um novo rim três vezes, por conta de tipagem sanguínea e outras compatibilidades, mas ao chegar na questão de tipagem HLA, a quantidade de antígenos era muito alta, impossibilitando o transplante.

Foi na quinta vez que ela conseguiu uma doadora compatível, e em 2023 foi realizado o terceiro transplante.

Desde então, ela, juntamente com sua equipe médica, vem cuidado de perto do pós-transplante. O tratamento de imunossupressão continua, assim como consultas médicas e exames mensais para verificar como o corpo está aceitando o novo órgão.

São 10 anos de uma jornada juntamente com médicos, enfermeiras e um tipo de especialistas acompanhando todos os passos de Paula. Uma conexão profundamente entrelaçada, que envolve confiança, trabalho árduo e empatia.

 A história da Paula é sobre resiliência. Sobre acreditar e buscar forças para continuar a ter os momentos com a família que são tão importantes.

É também um convite: fale com sua família sobre a doação de órgãos.

Hoje para a doação de órgãos de doadores falecidos ocorrer, a autorização dos familiares é essencial. Em 2024, 46% das famílias que tinham parentes mortos ou com morte cerebral diagnosticada se recusaram a fazer a doação.

Mas apesar do momento ser de dor e tristeza para esses familiares, uma decisão tomada pode salvar a vida de 8 pessoas.

Por isso falar com familiares e deixar claro o interesse em doar os órgãos é tão importante.

REFERÊNCIAS

Tipagem HLA: origens, inovações e perguntas contínuas | Notícias Clínicas da ASH | Sociedade Americana de Hematologia

Table: Medicamentos utilizados para evitar a rejeição de um transplante-Manual MSD Versão Saúde para a Família

Transplantes: famílias brasileiras têm se recusado mais a fazer doação de órgãos | Jornal Nacional | G1